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Artigo científico – Arqueoastronomia no Morro da Galheta
16 jun
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Artigo científico – Arqueoastronomia no Morro da Galheta

 

TRABALHO DE CONCLUSÃO DO Curso pós graduacão em Arqueologia

ARQUEOASTRONOMIA NO MORRO DA GALHETA, FLORIANÓPOLIS, SC

Adnir Antônio Ramos[1]

Raul Novasco[2]

 

Resumo: No Morro da Galheta, em Florianópolis existem pedras sobrepostas a outras que obedecem a características de monumentos megalíticos, cuja morfologia são semelhantes a de menires e dólmens e até mesmo de cromlech. Nossos estudos começaram através de observações empíricas em 1988 quando iniciou-se uma série de observações relacionando o movimento do sol durante as mudanças de estações com o posicionamento de tais blocos graníticos. Posteriormente, com o apoio da Prefeitura de Florianópolis ao projeto “Arqueoastronomia em Florianópolis”, sistematizou-se a pesquisa e verificou-se alguns alinhamentos arqueoastronômicos. Inicialmente, após observações in sito, foi verificado e documentado o alinhamento entre os principais monumentos e em seguida foram feitos estudos a partir de aerofotogrametria, levantamento por GPS geodésico e roteamento dos pontos georeferenciados. O estudo evoluiu para análise dos dados a partir de software como Stellarium e Google Earth. Com isso, descobriu-se que tais arranjos megalíticos fazem parte de um complexo marcador de tempo relacionado aos alinhamentos dos astros, especialmente ao do sol nos solstícios e equinócios e ao da lua em suas fases. Estudando o material bibliográfico constatamos a passagem de várias levas  de habitantes na região e descobrimos que em 1918 o Geólogo catarinense, Vieira da Rosa, havia feito um estudo da geologia do Estado de Santa Catarina, quando constatou que tais blocos graníticos não se encaixavam com os padrões geológicos. Neste artigo vamos focar em apenas um conjunto de megalíticos localizado na Fortaleza da Barra da Lagoa e em cinco outros que estão distribuídos na comunheira do morro da Galheta para mostrar que eles se completam e formam um modelo de marcador de tempo. Com este estudo pretendemos chamar a atenção dos órgãos responsáveis pela preservação do Patrimônio Natural e Arqueológico no sentido de um aprofundamento científico para que tais conjuntos megalíticos venham a fazer parte dos objetos arqueológicos reconhecidos e protegidos por lei, pois alguns deles já foram usados ou cederam espaço para a construção civil e outros estão correndo risco de desaparecer com o rápido processo de urbanização do litoral catarinense e também chamar a atenção para o potencial turístico capaz de ajudar na sustentabilidade das comunidades e até mesmo dos próprios objetos em estudo.

Palavras-chave: Sambaqui. Monumento megalítico. Dólmen. Menir. Cromlech.

 

INTRODUÇÃO

 O objeto desse artigo são os blocos graníticos fora da posição geográfica normal no Morro da Galheta já  mencionados em 1918 pelo geólogo Vieira da Rosa e a relação dos mesmos com a arqueoastronomia que vem sendo analisados a partir de 1988.

O Morro da Galheta esta localizado no litoral catarinense a leste da ilha de Santa Catarina, cuja geologia faz parte do Cinturão Dom Feliciano, no compartimento Batólito Florianópolis cuja composição pertence ao embasamento cristalino do Granito Ilha. (ALMEIDA, 1981 apud CORREIA, 2016, P. 10). Os estudos mostram que a geologia do entorno ao Morro da Galheta é formada por sedimentação costeira nas porções norte, leste e sul, tendo como ambientes deposicionais: lagunar, eólico, marinho praial e fluvial. (CARUSO Jr. (1989), apud JOCKYMAN 2015)

Os estudos arqueológicos e antropológicos revelam que já passaram algumas levas de povos na Ilha de Santa Catarina, sendo os primeiros que se tem notícia os sambaquieiros ou também chamados de construtores de montes, cuja evidencia dessa grande ocupação são inúmeras jazidas de conchas onde são encontrados elementos arqueológicos como: Ossadas, artefatos líticos, restos  alimentares e sepultamentos, entre outros. (Long & Mielke (1956), (Piazza (1966) e (JOCKYMAN, 2015). Depois deles temos a presença da  tradição cerâmica Itararé que costuma ser associada aos povos Laklãnõ-Xokleng e Kaingáng, falantes de línguas Jê e que vivem no interior de Santa Catarina. Por esse motivo, os sítios litorâneos com presença desse tipo de cerâmica acabam também sendo associados pelos pesquisadores a populações Jê que, vindas do interior, teriam se estabelecido no litoral e trazido a cerâmica consigo. Texto publicados em https://floripaarqueologica.com.br/. Ainda uma terceira leva pré-colombiana vem da matriz cultural Tupi e vinculados aos povos Tupi-guarani, os Guarani, que tiveram sua origem possivelmente no sudoeste da Amazônia, por volta de 2500 anos antes do presente AP, de onde iniciaram um movimento migratório chegando a se estender para o Paraguai, nordeste da Argentina, Uruguai e Bolívia,  até ao sul do Brasil. Até o momento, as datações apontam que os Guarani alcançaram o litoral catarinense por volta do ano 1000 da era cristã. Sítios arqueológicos Guarani estão presentes na Ilha de Santa Catarina e no continente, incluindo municípios da Grande Florianópolis. Texto publicados em   https://museu.ufsc.br/marque-virtual/3-populacoes-guarani/

Como nossa área de estudo tem no seu entorno a Bacia da Lagoa da Conceição,  apresentamos uma tabela referente aos estudos e datações de alguns dos 20 sítios arqueológicos registrados. (Tabela 1). De modo geral as datações obtidas para a base e o topo dos sambaquis do sul de Santa Catarina, indicam ocupações entre 7.000 e 1.000 anos AP, coincidindo com a formação dos ambientes deposicionais holocênicos, influenciados diretamente pelo último evento transgressivo-regressivo, com maior pico transgressivo a 5.100 anos AP.( JOCKYMAN, 2015)

Por último, levas de portugueses oriundos de Portugal, Ilha da Madeira e Ilha de Açores, deram sequência a sucessivas correntes migratórias até os dias atuais. No livro “Santa Catarina: a Ilha”,  Virgílio Várzea descreve a Ilha de Santa Catarina como abrigo de viajantes que paravam para abastecerem-se de provisões e fazerem reparos em suas embarcações, Segundo Várzea (1985), a colonização Portuguesa começou com uma pequena colônia fundada por Francisco Dias Velho no ano de 1651, bandeirante oriundo de São Paulo, que veio atraído pelas notícias da Ilha, do comércio que aí se fazia e da índole mansa dos indígenas, e resolvera transportar-se para ela com toda a família.

Após a criação da capitania da Ilha de Santa Catarina (1738) o Brigadeiro José da Silva Paes  foi designado para organizar o sistema de defesa da ilha o qual implantou uma política  de ocupação da área e a partir de 1748 até 1756, trazendo levas de imigrantes açorianos que foram instalados em locais estratégicos para auxiliar no povoamento e fornecer apoio aos contingentes militares da Ilha de Santa Catarina. (SOUZA, 1985). (PINTO, 2013).

Em meio a todas essas estruturas geológicas e históricas / cultural composta por sambaquis, oficinas líticas e arte rupestre, ruinas de fortes, casarios e igrejas que comprovam a passagem do homem  na região, existem os monumentos megalíticos que não foram dados a devida atenção do ponto de vista arqueológico. No entanto, é necessário que se tenha um olhar diferenciado para os sítios megalíticos afim de relaciona-los e integra-los aos sítios pré-coloniais, pois assim como os sambaquis foram destruídos por falta de estudo e entendimento quanto a sua importância histórica e patrimonial, o mesmo vem acontecendo com tais estruturas megalíticas devido a especulação imobiliária e a ocupação desordenada do litoral. Durante os 35 anos dedicados à pesquisa na área de arqueoastronomia já documentamos a destruição e desaparecimento de algumas estruturas megalíticas mencionadas em 1918 pelo geólogo Vieira da Rosa. Com os estudos da arqueoastronomia no Morro da Galheta, intencionamos somar nossos esforços aos de muitos outros pesquisadores na busca pelo reconhecimento e preservação do patrimônio natural e patrimonial da humanidade.

 Figura 1 – Mapa de localização dos 17 sambaquis no entorno da Laguna da Conceição.


Fonte: Karel Jockyman & Aline Pires Mateus; Bueno et al., 2015.

ARQUEOASTRONOMIA

A Arqueoastronomia é a disciplina que estuda os conhecimentos astronômicos legados pelas culturas pré-históricas cuja maneira de expressar o saber era através da pintura, gravura em rochas e posicionamento de rochas na paisagem, e estuda também os povos antigos capazes de elaborar textos escritos, tais como os mesopotâmios, os egípcios, os gregos e os maias. (Afonso 2002)

Historicamente a arqueoastronomia surgiu com as pesquisas do astrônomo Sir Joseph Norman Lockyer, fundador da conceituada revista britânica Nature. Em 1891, ele estudou as orientações astronômicas de certos templos da Grécia clássica e das pirâmides e templos do antigo Egito. Mais tarde, forneceu explicações astronômicas mais detalhadas sobre os megálitos de Stonehenge e os menires da Bretanha […] (França) (LOCKYER, 1893 apud AFONSO, 1994, p. 53).

Há cinco décadas a arqueoastronomia recebeu novos reforços com as pesquisas do astrônomo Gerald Stanley Hawkins. Em 1963 ele escreveu o livro “Stonehenge Decodificado”, mostrando que essa construção megalítica, iniciada há mais de 4 mil anos, poderia ser utilizada como observatório solar e lunar para a previsão de eclipses (Hawkins, 1963, apud AFONSO 2003 P 53. ). A partir de 1970, a Arqueoastronomia começou a ser ministrada como disciplina em algumas Universidades, sobretudo nos Estados Unidos e na Europa.

De Forma geral a Arqueoastronomia busca verificar se monumentos estão orientados para os pontos cardeais ou para as direções do nascer e ocaso do Sol, da Lua ou de estrelas mais brilhantes, passíveis de medições astronômicas, dando a estes monumentos uma utilidade prática na determinação do calendário ou na orientação dos grupos humanos.  Ela também pode estudar a arte rupestre e o posicionamento dos sítios arqueológicos e atribuir a ela conotações astronômicas. (AFONSO; RAMOS. 2002)

No Brasil, em 2001, localizamos na Ponta do Gravatá, Florianópolis (SC), um monólito orientado para os pontos cardeais, perto de diversas rochas orientadas para as direções do nascer e do pôr do sol nos solstícios. Segundo Dr. Germano Afonso a semelhança estrutural do conjunto rochoso de Florianópolis com o de Salto Segredo (PR), com o de Central (BA), com o de Puna de Catamarca (Argentina), com o do Monte Roraima (RO) e com o de Nabta (Egito) é surpreendente. No entanto, devemos considerá-la normal, tendo em vista que a observação empírica do Sol feita por diferentes povos segue, aproximadamente, a mesma metodologia. (AFONSO; RAMOS, 2002). Outra importante pesquisa na área de arqueoastronomia vem sendo realizado em Calçoene no Amapá. (CABRAL, M. P., SALDANHA, J. D. M. (2008)).

 Monumento Megalítico

O termo Monumento megalítico, ou megálito, do grego mega, megalos, grande, e lithos, pedra, designa uma construção monumental com base em grandes blocos de pedras rudes. (WIKIPEDIA, 2020). “Os monumentos megalíticos são conjuntos de construções milenares feitas com grandes blocos de pedras que pesam toneladas”. (ESCANO, 2020, p. 1). Acredita-se que muitas dessas “construções são típicas dos povos da pré-história, correspondente ao período Neolítico que começou cerca de 10 mil anos a.C.”.(ESCANO, 2020,).

 Dólmens

De acordos com a Wikipédia enciclopédia livre, os dólmens são monumentos megalíticos construídos por humanos (datados desde o fim do V milênio a.C. até ao fim do III milênio a.C., na Europa, e até ao I milênio, no Extremo Oriente). O nome deriva do Bretão dol = mesa e men = pedra. Também são conhecidos por antasorcasarcas, e, menos vulgarmente, por palas. Popularmente, são também por vezes designados por casas de mourosfornos de mouros ou pias.

A configuração mais básica de dólmen é trilítica: uma laje de pedra horizontal colocada sobre duas pedras posicionadas verticalmente para formar a construção, onde os elementos estruturais enquadram um espaço quadrangular. É muito comum também os encontrar apoiados sobre três pedras colocadas verticalmente. De acordo com website Stud História (2023), no mundo todo foram registrados cerca de 50.000 mil dólmens (Figuras de 4 a 8).

 

Figura 3 e 4 – Dólmen da Oração, Florianópolis, SC, Brasil; Alinhamento da 1ª lua cheia do solstício de verão e do sol no solstício de Inverno.


fonte: Acervo do autor

Figura 5 – Dólmen, de Ferr’ères-Haut à                 Figura 6 – Dólmen Pedra Virada em                                                                                                  limogne-en-Quercy   França                                            Florianópolis, SC Brasil       


Fonte: Acervo de https://museedupatrimoine.fr                         Fonte: Acervo do autor

Apoiados sobre três bases é uma característica muito marcante e foi usado para posicionar não só os dólmens, mas menires também. Essa maneira de equilibrar os objetos torna-os muito estáveis e mostra o caráter do conhecimento, a sabedoria e o poder dos povos construtores desses equipamentos socioculturais.

Figura 7 – Dólmen Kilclooney, Donegal, Irlanda                  Figura 8 – Dólmen de Anicuns, GO

  
Fonte: https://br.depositphotos.com/stock-photos/kilclooney.html     Fonte: Acervo do autor                 

Menires

Etimologicamente a pala menir foi adotada, através do francês, pelos arqueólogos do século XIX, com base nas palavras do Bretão, significando men = pedra e hir = longa (comparar com o Gaélico: maen hir = pedra longa).  No Bretão moderno usa-se a palavra peulvan. Em português também se denomina perafita, do latim “petra ficta” (“pedra fixa/fincada”) (wikipedia.org,2023)

A diferença dos menires que estamos estudando, para os menires da Europa, por exemplo, é que os nossos menires estão colocados em cima de outra rocha, enquanto os de lá estão colocados diretamente no solo, aqui também temos alguns com essa característica, mas a maioria deles costuma ser muito maior e apoiado sobre outra rocha.

Um dos maiores menires da Península Ibérica, em Portugal é o Menir da Meada, medindo mais de 6 metros de altura a partir do solo. Ao todo mede 7,15 metros de comprimento. Parte está soterrada para lhe dar estabilidade e um diâmetro máximo de 1,25 metros, este implantado de forma isolada no patamar granítico do Rio Server, fazendo parte de um conjunto de dólmens e menires da mancha megalítica da Serra de São Mamede. (VEIGA, 2016).

Enquanto o menir da Meada que mede cerca 7,15 metros é considerado o maior da região na Europa, no Brasil temos talvez o maior menir do Mundo, a Pedra do Osso em Realego, Rio de Janeiro, que mede mais de 20 metros de altura. Segue imagens de menires. (Figuras 9 e 17).

Cromeleque

Etimologicamente o termo cromeleque procede do inglês cromlech, que por sua vez deriva do galês antigo “’crowm”, “torto” (Crom em feminino), e lech, “laje”. Portanto o significado literal seria “laje (colocada em) curva”.  Wikipédia (2012)

No Brasil dois Cromeleque se destacam e vem sendo pesquisados, o mais conhecido da arqueologia é o sítio Parque Arqueológico do Solstício em Calçoene, Amapá, onde foram feitas escavações pelo arqueólogos Mariana Cabral e João Saldanha. (Figura 20). O segundo, é o Observatório Pedra Virada no Morro da Galheta em Florianópolis, SC, pesquisado pela equipe do Instituto Multidisciplinar de Meio ambiente e Arqueoastronomia – IMMA, e é  atualmente o mais visitado do Brasil por turistas e grupos de estudantes. (Figura21). No entanto, apesar de tantas evidencias das características morfológicas e alinhamentos astronômicos do acervo megalítico e apesar de todo avanço tecnológico a arqueoastronomia no Brasil ainda enfrenta muitos desafios, está nos primeiros passos para ser consolidada e se estabelecer como ciência. E enquanto isso o acervo megalítico vai sendo depredado, assim com foram os sambaquis antes de serem considerados obras da intencionalidade humana.

ARQUEOASTRONOMIA NO MORRO DA GALHETA:  RÁPIDO HISTÓRICO DA DESCOBERTA

No solstício de inverno de 1988, nosso barco (Marisca) que hoje está num pequeno museu na trilha do Dólmen da Oração, se alinhou com o sol nascendo no horizonte do Oceano e com a Pedra do Frade no costão da Galheta. Atrás da pedra do Frade há outro grande megálito na mesma altura onde a sombra projetada pela pedra da frente quase cobre o megálito atrás de si no solstício de inverno (Figura 22).

Nesse dia veio uma intuição de que aquelas rochas que se destacavam na paisagem tinham uma relação com os solstícios e equinócios. À época, estava lendo uma literatura que mencionava este assunto em vários lugares do mundo, menos aqui. Mas foi no mês de julho do mesmo ano que vi a lua nascer no meio de dois grandes blocos no cimo do Morro da Galheta, atrás de minha casa, as quais mais tarde denominamos de Pedra Virada, o bloco do sul e Pedra do Útero, o bloco do norte. Naquele instante outra forte intuição me levou a crer que aqueles e outros blocos graníticos que se destacavam no cimo do mesmo morro faziam parte de um calendário solar. Ao virar essa chave da consciência, comecei a colocar o sol todas as manhãs no meio das duas pedras onde eu havia visto a lua nascer, (Figura 23) e fui caminhando com o sol no meio delas. Enquanto o sol se deslocava para o sul, eu me dirigia para norte, até que no dia 25 de novembro do mesmo ano descobri atrás da casa de meus pais uma Plataforma onde eu pude parar e ver o movimento aparente do sol nascendo atrás do morro Galheta e passando pelas ou pedras que eu suspeitava fazerem parte de um calendário. (RAMOS, 2018).

Minha suspeita foi se confirmando à medida que fui acompanhando o deslocamento do sol passando pelos megálitos diariamente a partir da Plataforma nos solstícios e equinócios. Essas descobertas levaram a prefeita de Florianópolis em 2002, Dona Ângela Amin, Dra. em Engenharia do Conhecimento, a se interessar pelo assunto, e fez com que o Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis – IPUF, financiasse um levantamento aerofotogramétrico do morro da Galheta e das coordenadas geográficas de 40 megálitos que verificamos estarem fora da posição geográfica normal.

Após o georreferenciamento dos 40 megálitos no promontório leste da Bacia da Lagoa da Conceição, contratamos o arqueoastrônomo Dr. Germano Bruno Afonso para fazer o roteamento dos pontos georefenciados.

Nessa primeira etapa de nossas pesquisas levamos em consideração somente o ângulo sol no azimute na direção do nascer do sol nas mudanças de estações na linha do horizonte. Ao analisarmos as direções definidas pelos 40 pontos selecionados, cujas coordenadas foram obtidas com o Sistema de Posicionamento Global (GPS), representados no mapa da Aeroconsult S/A, Contrato N0 97/IPUF/2000, chegamos à conclusão de que existia pelo menos dois prováveis locais de observatórios indígenas, constituídos de megálitos que se localizam na Ponta do Frade, costão da Galheta  e na Ponta do Gravatá, extremos da praia (cabos). (AFONSO; RAMOS 2002).

Neste artigo concentramos nossos estudos na observação a partir da Plataforma arqueoastronômica da Fortaleza da Barra da Lagoa, com movimento aparente do sol e da lua em relação a cinco conjuntos de rochas graníticas que são referenciais no cimo do morro da Galheta onde a altura do sol está acima do horizonte a aproximadamente +16º (graus), pois, no primeiro momento não foram considerados os monumentos que estavam acima da linha do horizonte.

Em nossos estudos utilizamos como metodologia quatro ferramentas: o Google Earth, o Stellarium, os dados do relatório Arqueoastronomia em Florianópolis de 2002 e a observação de campo (in sito). O Google nos fornece o ponto em que o sol nasce a partir da plataforma e o horário, além de medidas, marcadores e direções. No Stellarium podemos ver além de muitos outros recursos, o ângulo e a altura do sol no horário em que o sol nascer no cimo do morro da Galheta, nas datas de mudanças de estações ou em qualquer instante que seja necessário analisar. Por sua vez, os dados do relatório nos fornecem às coordenadas geográficas precisas, as direções e distâncias que foram traçadas a partir dos 40 megálitos. E, por fim, foram utilizadas as observações de campo feitas quase que diariamente, onde registramos por meio de fotos e vídeos, o horário e a posição em que o sol nasce no topo morro da Galheta e cujo nosso ponto de referência será um conjunto de megálitos que compõe o que denominamos Plataforma Arqueoastronômica da Fortaleza da Barra da Lagoa.

A tecnologia atual, somada ao acesso à Internet, facilitou muito a realização desta pesquisa, pois atualmente essas ferramentas têm maior precisão, o que facilita o cruzamento dos dados de observações feitas em campo com os dados obtidos no Google Earth, no Stellarium e no Relatório.

No Google Earth marcamos os pontos no mapa tendo como referência a Plataforma, e traçamos linhas direcionadas para outros megálitos com a ferramenta régua que nos fornece a distância e a direção no azimute entre os pontos marcados. Para fazermos esses procedimentos, usamos como ponto de referência a Plataforma e cinco outros megálitos no cimo do Morro da Galheta, que são os objetos de estudo para esse artigo. Ainda no Google Earth usamos a ferramenta zoom direcionada para a plataforma até o nível do solo. Com o uso da ferramenta “inclinar”, inclinamos ao máximo até o nível do horizonte, e como num voo de drone vemos o morro da Galheta a leste da Plataforma. Na ferramenta “regulador de zoom”, coloca-se a data e o horário em que o sol nasceu no morro. Percebemos que com o uso desses mecanismos digitais quase que eliminamos a necessidade de estar todos os dias observando o nascer dos astros, pois a precisão dos dados é quase semelhante ao obtido in sito.

Após esses procedimentos usamos outro Software, o Stellarium, para cruzar os dados. No Stellarium ativamos as seguintes ferramentas: linhas das constelações, rótulos das constelações, figuras das constelações, grade equatorial, superfície, pontos cardeais, data e hora e cronometro pausado.

O procedimento seguinte foi digitar na janela data e hora do Stellarium os dados obtidos em campo e no Google Earth (data e hora) em que o sol ou a lua nasceu na direção dos megálitos, objeto em estudo, e clicamos em cima do sol ou da lua para se ter uma configuração completa do céu no instante em que desejamos pesquisar e os dados relativos ao astro em evidência. Com esses procedimentos o Stellarium nos fornece entre muitos outros dados, a altura e direção no azimute em que o astro selecionado está no céu. Por fim, confrontamos os dados fornecidos pelos softwares com as direções calculadas por Dr. Germano, e conforme está registrado no relatório Arqueoastronomia em Florianópolis de 2002. (Figura 24).

Por meio desses recursos verificamos que a Plataforma na Fortaleza da Barra da Lagoa é um ponto referencial para acompanhar os movimentos dos astros em relação aos cinco conjuntos de monumentos megalíticos no morro da Galheta, os quais passaremos a descrever e a ilustrar a seguir.

PLATAFORMA ARQUEOASTRONÔMICA NA FORTALEZA  DA BARRA DA LAGOA

A plataforma é um grande bloco de granito rosa que mede 29 metros de diâmetro, 7 de altura, 9 de largura na parte de cima no sentido Norte/Sul e 6,5 metros, no sentido Leste/Oeste. Ela está apoiada sobre a rocha base do morro e sobre um fragmento da rocha base (Figura 25). Entre a rocha fragmento e a plataforma, quatro pequenas pedras foram usadas para nivelar a parte de cima da plataforma (Figuras 26 e 27). Temos observado que é uma característica o apoio sobre quatro bases e que é uma espécie de testemunho da intencionalidade e da estratégia de se alterar um lugar natural para uso pré-determinado. No início do inverno, quando o sol projeta seus primeiros raios no cimo do morro da Galheta, um feixe luz ultrapassa por entre essas pequenas pedras projetando e iluminando um canto embaixo da plataforma[1].

[1] Assista ao vídeo: https://youtu.be/fsj4xBU0v8w

Além das quatro pequenas pedras terem um aspecto de intencionalidade, duas falhas geológicas também foram aproveitas, ambas da face do lado oeste da plataforma. Uma que mede quase 6 metros de comprimento e foi movida da lateral oeste para parte de cima da plataforma. Serve para aumentar a superfície e é exatamente no espaço aumentado que o observador deve se posicionar para encaixar o sol nascendo no dia 25 de novembro no meio dos dois maiores blocos do observatório Pedra Virada. (Figuras 28, 29 e 30).

A outra lasca da mesma face é também uma falha geológica que foi retirada uma pouco mais acima da primeira e serve de base para chegar ao abrigo formado pela plataforma. (Figuras 32 e 33).

Como podemos perceber, essa falha geológica natural em evidência deveria esta caída na sua base, ou seja, na frente. No entanto, a fase que se desprendeu está na parte superior da rocha, deixando bem claro que houve intencionalidade e transporte.

ANÁLISE DO MOVIMENTO DO SOL NO MORRO DA GALHETA A PARTIR DA PLATAFORMA

 

Conforme relatei no livro “Divino Gênese: a descoberta do pescador Antropólogo na ilha de Santa Catarina” (RAMOS, 2018), dia 25 de novembro de 1988 flagrei o sol nascendo no meio dos dois grandes blocos do observatório Pedra virada, que são perfeitamente visíveis da plataforma, como mencionei anteriormente, na ponta da face que foi trazida do lado oeste para alongar a plataforma. (Figura 34).

Dia 25, o sol se encaixa no meio de duas estrelas na constelação de escorpião, Ômega 1 e Ômega 2 (Jabat e Acrabi) e nasce no horizonte a 113º 26’19.5” às 5:18. Às 6h40min, quando o sol aparece no meio dos dois Blocos do observatório Pedra Virada, o Stellarium calcula a altura em +15º 50’49.4” e o azimute =105º 28’32.4” (Figura 36). Como pode ser constatado na captura de tela da imagem do Google Earth, entre o dia 24 e 26 de novembro, o sol nasce bem no ponto em que foi traçada a linha que mede a distância e dá a direção da plataforma para a Pedra virada. Na captura de tela está registrada a data, horário e o ponto em que o sol nasceu e pode ser confrontado com mesmo instante no Stellarium, mudando a data em que o sol nasce no meio das duas estrelas (ômega 1 e ômega 2), na constelação de escorpião, entre 24 e 26 de novembro, por causa do movimento retrógado dos astros. Esse azimute confere com os dados do relatório, onde a Pedra Virada e a Pedra do Útero são tidas como ponto 20 e 21 e a plataforma como ponto 23. (Quadro 1).

SOLSTÍCIO DE VERÃO  A PARTIR DA PLATAFORMA

 

No dia 21 de dezembro, se o observador permanecer no mesmo ponto que esteve no dia 25 de novembro, ele vai perceber que o sol se deslocou para o sul quase 3 graus a mais. A princípio pensava-se que o sol nascia na direção do Dólmen da Oração, mas conferindo as imagens no Google e no programa do Stellarium, bem como pela direção indicada no Relatório, verificou-se que o Dólmen da oração está a 110º54’39,04” e que o sol nasce a 108º13’, que é a posição do sol é entre a Pedra Virada e o Dólmen da Oração (Figura 37).

Dessa forma, para o observador manter o sol no meio da Pedra Virada, ele precisa continuar a se deslocar para o norte até o dia 21 de dezembro quando o sol parar, e na semana seguinte começa a retroceder para o norte. Foi acompanhando essa trajetória do sol no meio da Pedra Virada que descobrimos que a distância a ser percorrida para o norte é de 20 metros e que essa distância culmina com o final de outro bloco de rocha que está ao norte da plataforma, conforme registrado no dia, em fotos e vídeos.

Atualmente essa visualização já está bem comprometida, árvores e casas já obstruem o campo de visão do observador. É bem provável que na época da construção desse observatório o mar fosse o limite para observador, pois como pode ser constatado, na base onde termina a rocha, o solo é composto de uma camada de terra preta com material orgânico e outra com areia de praia com sedimentos de conchas marinhas. É bem provável que a vegetação estava num estágio primário de cobertura, o que não deveria causar dificuldade de observação astronômica e inclusive porque a vegetação pode ser controlada. Esse registro só foi possível porque nesse último solstício de verão, em dezembro de 2022, limpamos o entorno da plataforma e registramos o nascer do sol no referido ponto às 7 horas da manhã nascendo entre a Pedra Virada e a pedra do Útero (Figuras 38, 39 e 40).

EQUINÓCIOS A PARTIR DA PLATAFORMA COM O MENIR CENTRAL

Quando temos um ponto referência, no caso a Plataforma, e podemos ir até ele quase todas as manhãs para ver o sol nascer no alto do morro aprendemos por experiência própria que existe uma biodinâmica que faz o sol se mover na paisagem, movimento esse conhecido como dança aparente do sol. Aparente, porque não é o sol que se move, mas, sim, um efeito causado pela inclinação do eixo da terra e seu movimentos de rotação e translação.

Atualmente, a inclinação axial da Terra é de aproximadamente 23º  26º  (vinte e três graus e 26 minutos de arco). Então quando o observador fixa-se num determinado ponto, depois do Solstício de verão, ele começa a perceber que o sol se desloca lentamente para o norte até atingir o trópico de Câncer, momento conhecido como solstício de inverno, para quem o observa no hemisfério sul.

Foi acompanhando essa biodinâmica, que registramos o alinhamento do sol a partir da plataforma com o Menir Central nos equinócios de outono e primavera. O Menir Central é um bloco de granito ilha, que mede 3,80 metros de altura por 12 metros de circunferência e está no cimo do morro da Galheta apoiado a uma base de 1 metro de altura no lado leste e a 12 metros no lado oeste. Atualmente a mata está encobrindo-o, mas durante a década de 80 e 90 do século passado, ele se destacava na paisagem a longa distância, e está localizado ao lado do caminho mais antigo do morro da Galheta, conhecido como Caminho do Rei.

O Caminho do Rei, na Ilha de Santa Catarina, tinha início no Oeste onde hoje é a cidade de Florianópolis, passava às margens da Lagoa da Conceição e vinha em direção à barra da Lagoa, passando ao lado da Plataforma onde bifurcava para a praia da Barra da Lagoa pela margem direita do canal, pois não havia ponte para atravessar o canal e o outro ramal subia o morro em direção à praia da Galheta, onde há artes rupestres, oficinas líticas e enterro de esqueletos humanos.

Desde a mais tenra idade ao transitar pelo Caminho do Rei, cruzava com o menir Central, especialmente quando eu ia pescar com meu pai Antônio Tomaz Ramos (in memoriam) na praia da Galheta durante a safra da Tainha. Nessa época, cada propriedade era dividida em faixas de terra que tinha frente para o canal da Lagoa e fundo para o Mar Grosso e seus proprietários cultivavam o solo para a subsistência das famílias e também criavam gado no morro o que fazia com não houvesse arvores nas proximidades  do Menir Central e ele fosse visto a longa distancia.  Foi a paisagem da época que  favoreceu o despertar de minha curiosidade, pois esses monumentos megalíticos, atraiam minha atenção toda vez que passava por eles. Atualmente o Menir Central não é mais visto da plataforma ou de qualquer outro lugar que não seja de sua proximidade, pois está coberto por árvores exóticas e nativas (Figura 40).

De acordo com nossas pesquisas, a partir dos cálculos feitos pelo Google Earth e o Stellarium e comparação com os dados do relatório, constatamos que o Menir Central está alinhado com a Plataforma Arqueoastronômica da Fortaleza da Barra para os equinócios de outono e primavera. (Quadro 2) (Figuras 41, 42

Na Figura 41, a linha amarela destaca o ponto entre a Plataforma (PE 23) e o Menir Central (PE 16). Esses dados do Google Earth estão expressos no informativo da régua de medir no canto da Figura 36, podem ser comparados aos dados do Stellarium e do relatório. (Ver quadro 2)

SOLSTÍCIO DE INVERNO

Ao norte do Menir central, próximo à pedra da Boa Vista, outro bloco de rocha também se destacava na paisagem. Hoje ele está quase totalmente encoberto pela mata, e o apelidamos de Pedra do Dalton, por estar na propriedade de Dalton Lemos, pesquisador da arqueoastronomia e membro  do IMMA. (Figura 44).

Depois que o sol passou do Menir Central, continuamos a acompanhar o deslocamento dele diariamente rumo ao norte. À medida que o solstício de inverno se aproximava o sol passou pela Pedra da Boa Vista e nasceu um pouco mais ao norte. Então, um dia estando na praia da Barra da Lagoa, vi que um bloco de rocha sobressaia a silhueta do morro, bem na posição em que havíamos visto o sol nascer da Plataforma. Na época, em 1989, o capim gordura cobria boa parte do morro da Galheta, então era fácil chegar nessas rochas sem empreender muito esforço. Sem hesitar, fui até o local e verifiquei que o bloco estava sobreposto a outro e que de fato era ele quem marcava o solstício de inverno, como havíamos observado. Nesse dia fui surpreendido, pois avistei outro megálito que também sobressaía a silhueta do morro ao norte do megálito que estava analisando. Foi quando, descobri o dólmen que apelidamos de Pensador (Figura 45).

Ao analisar a Pedra do Dalton, verificamos como nos alinhamentos anteriores a mesma conformidade entre o relatório, o Google Earth e o Stellarium. (Figuras 46 e 47). Os dados do relatório para comparação são expostos no Quadro 3. (PE 23 Plataforma e PE 11 Pedra do Dalton).

Depois que o sol passou do Menir Central, continuamos a acompanhar o deslocamento dele diariamente rumo ao norte. À medida que o solstício de inverno se aproximava o sol passou pela Pedra da Boa Vista e nasceu um pouco mais ao norte. Então, um dia estando na praia da Barra da Lagoa, vi que um bloco de rocha sobressaia a silhueta do morro, bem na posição em que havíamos visto o sol nascer da Plataforma. Na época, em 1989, o capim gordura cobria boa parte do morro da Galheta, então era fácil chegar nessas rochas sem empreender muito esforço. Sem hesitar, fui até o local e verifiquei que o bloco estava sobreposto a outro e que de fato era ele quem marcava o solstício de inverno, como havíamos observado. Nesse dia fui surpreendido, pois avistei outro megálito que também sobressaía a silhueta do morro ao norte do megálito que estava analisando. Foi quando, descobri o dólmen que apelidamos de Pensador (Figura 45).

Ao analisar a Pedra do Dalton, verificamos como nos alinhamentos anteriores a mesma conformidade entre o relatório, o Google Earth e o Stellarium. (Figuras 46 e 47). Os dados do relatório para comparação são expostos no Quadro 3. (PE 23 Plataforma e PE 11 Pedra do Dalton).

Recentemente descobrimos que os Monumentos Pensador e Dólmen da Oração estão relacionados com o movimento da lua que ultrapassa os limites do sol nos trópicos em 5º (cinco graus).  (Figuras 48 e 49).

Como vem sendo observado em campo, constatado nos aplicativo digitais e comparado como o relatório Arqueoastronomia em Florianópolis de 2002, a plataforma na Fortaleza da Barra da Lagoa com os outros cinco conjuntos de monumentos megalíticos no cimo do morro da Galheta está aferida para marcar o deslocamento do sol, nas mudanças de estações e o movimento da lua no seu limite máximo nos hemisférios norte e sul. (Figura 50 e 51).

Para ver o movimento do Sol no Morro da Galheta a partir da plataforma assista o vídeo “Arqueoastronomia no Morro da Galheta”[1].

[1] Assista ao vídeo: https://youtu.be/ZsU6EzDmYDo

DISCUSSÕES

Como podemos perceber, o morro da Galheta é fruto do ciclo Brasiliano, resultando da colisão de importantes unidades cratiônicas que aconteceram entre 600 e 560 milhões de anos AP, que o nível relativo do mar já transgrediu e regrediu muitas vezes e onde milhares de vidas já passaram e se desenvolveram nesse promontório. Porém, segundo às pesquisas, a passagem do homem nessa região é recente em relação à idade geológica, pelo menos é o que sabemos. De 7 mil anos AP para cá, poucos foram os intervalos de tempo em que esses lugares deixaram de ser habitados por grupos humanos, culminando com a recente explosão demográfica.

As pesquisas arqueológicas ainda não sabem ao certo como o Homem do Sambaqui chegou e nem com sumiu há 1 mil AP. Ainda é incerta a origem dos ceramistas da língua do tronco Jê, tudo ainda permanece uma incógnita, até o período que chegaram o povo Guarani no litoral. Tudo o que sabemos é que existiu muito material arqueológico e que entre os século XvIII e XX  a maior parte dos sambaquis foram destruídos, cujas conchas e esqueletos humanos foram transformados em calcário para construção dos casarios, fortes, igrejas e corrigir solos. As oficinas líticas também fazem parte do acervo arqueológico e é um dos maiores acervos líticos do mundo, mas sofrem os mesmos desafios quantos ao estudo e a preservação. A arte rupestre é outro testemunho da passagem de pessoas aqui no litoral catarinense, além de pouco estudadas, muitas delas ainda não foram catalogadas e inclusas no Catálogo Nacional de sítios Arqueológicos (CNSA–IPHAN). Mas o que é mais assustador é que  existe outro material arqueológico que a arqueologia ainda desconsidera: os sítios megalíticos que ainda não recebeu a devida atenção por parte dos arqueólogos, universidades e principalmente por parte do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN.

Assim como não temos respostas para muitas perguntas quanto à origem, modo de vida e costume dos povos pré-colombianos,  nem repostas para quem, quando, como e qual o significado da arte rupestre e nem para os sambaquis, também não temos respostas para quem construiu e como form deslocados os monumentos megalíticos do litoral catarinense, mais nem por isso deve a ciência descartá-los e deixar-los a sua própria sorte. Parafraseando o professor Danilo Curado, da disciplina de Legislação do Patrimônio Arqueológico Brasileiro, que citou o professor Dr. Eurico Miller: “seja o que for , seja a cerâmica, seja a sedentarizarão,  sejam desenhos rupestres, sejam sambaquis, todos se repetem ao redor do mundo, onde os fenômenos da natureza influenciaram toda trajetória da humanidade 5.

5 Transição do vídeo gravado em aula.

São muitas as perguntas com relação aos monumentos megalíticos: Quem os modificou? Como foram transportados? Quando foram construídos? Para o que eles servem? O que sabemos é que não temos condições de responder a maioria dessas perguntas, mas sabemos que há uma ocorrência deles em todo planeta. Nossa preocupação nesse primeiro momento é analisar alguns aspectos que evidenciam o caráter intencional desse acervo até então desconsiderado. Aspectos como o deslocamento de algumas falhas geológicas e o alinhamento astronômico, como tentamos explicitar aqui neste artigo, usando instrumentos e metodologia científica para mostrar que estamos diante de um rico material arqueológico que precisa ser reconhecido para ser preservado, para que nós e futuras gerações possamos estudar e desvendar muitos dos mistérios que ainda os cercam.

Não podemos permitir que aconteça com esse valioso acervo o que aconteceu com os nossos sambaquis, ou seja, nossas antigas pirâmides de concha e areia que foram destruídos porque se dizia ser obra da natureza. Não fossem os estudos dos pioneiros, teríamos perdido toda biblioteca sambaquiana. Eu mesmo já acompanhei a destruição de alguns monumentos megalíticos, mencionados em 1918 pelo pesquisador geólogo Vieira da Rosa. Aqui mesmo nos arredores do morro da Galheta alguns deles já estão ameaçados. Recentemente documentei a falta de um no costão sul da praia Mole. Espero poder dar continuidade aos meus estudos, para levar a cabo esse desafio de contribuir por meio da ciência para validar a tese de que as pedras sobrepostas a outras, mencionadas pelo Geólogo Vieira da Rosa, são monumentos que pertencem não só ao Patrimônio Natural, mas também à Cultura Humana. Pois, além dos dois observatórios de horizonte constatado pelo professor Dr. Germano Afonso em 2002, atualmente com o uso das ferramentas digitais e observações in loco mostramos aqui que a partir da plataforma podemos acompanhar os alinhamentos do sol nos solstícios e equinócios e o limites da lua em seu deslocamento entorno da terra e até mesmo de certas estrelas brilhantes. Essas evidencias mostram que esses espaços foram amplamente usados pelos povos pré-coloniais para observação do céu e consequentemente na regulagem de seu cotidiano, marcando seus ciclos de colheitas, pesca, caça e fertilidade.

De forma geral o estudo da arqueoastronomia, vinculado aos monumentos megalíticos na paisagem, a arte rupestre e a ordenação espacial dos sambaquis, pode contribuir com a arqueologia na ampliação das discussões sobre o processo de ocupação e da relação dessas populações com o espaço e especialmente contribuir para a preservação desses monumentos.

CONSIDERAÇOES FINAIS

Como escreveu o geólogo Vieira da Rosa, não podemos furtar  a mais uma observação, todas as pontas e cabos, todas às nossas ilhas e ilhotas, mesmo no interior da terra existem abundancias desses colossais blocos de granitos, uns como a Pedra Balão e a Pedra da Listra coroam o cimo das montanhas, outras formam as encostas ou bordam os costões do nosso Mar Grosso e enfeitam a paisagem de nossas baias. (VIEIRA DA ROSA (1918) apud RAMOS 2004). Precisamos que a arqueologia de um modo geral dê mais atenção a eles, porque estão sendo destruídos e eles fazem parte do Patrimônio Natural e Cultura da região, pois os estudos comprovam que a observação do céu esteve na base do conhecimento de todas as  sociedades antigas, pois elas foram influenciadas pela confiante precisão dos desdobramentos cíclicos de certos fenômenos celestes tais como o dia, a noite, as fases da lua e as estações do ano. Acreditamos também que se a arqueologia e órgãos como IPHAN e Universidades derem mais atenção a esse monumentos megalíticos as comunidades poderão vir a se apropriar deles como objeto de pesquisa, cultura e turismo. Temos muitos exemplos de sítios arqueológicos onde o turismo contribui para a sustentabilidade das comunidades, para a preservação dos mesmos e para um despertar da curiosidade científica dos jovens. Acreditamos que um consórcio de pesquisadores de várias áreas do conhecimento possam trazer à luz informações a cerca do uso dos monumentos megalíticos por nossos ancestrais, de seu modo de vida e comportamento para com a natureza beneficiando todas as futuras gerações.

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